sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

Cores Sujas

Eu não vou te contar tudo. Tudo é muita coisa. Então deixarei que você tenha apenas um breve vislumbre, como se olhasse dentro dos meus olhos por alguns segundos, como que por uma brecha de uma porta, antes que eu os feche em fuga.

Nessa metáfora, você veria um bosque. Sempre gostei de bosques. Acho que eles podem representar analogamente muito bem meu interior. No bosque que você montou em sua mente nesse instante é dia ou noite? No meu está sempre anoitecendo, num céu de baunilha, tons púrpura e laranja misturando-se ao longe, quase completamente escuro, mas não o bastante, ainda é possível ver. Você imaginou apenas árvores? Verdes? Gostaria de saber como imaginou esse bosque antes de eu o revelar a você.

Meu bosque é todo entre um verde musgo e cinza. Leve em consideração a pouca luz. Mas essa luz se move e, quando os raios chegam até o nível da visão, é possível identificar uma paleta de cores sujas. Você consegue então distinguir diferentes tipos de árvores, todas extremamente altas, você não vê os cumes olhando só para frente; grupos de árvores com espaços entre elas, espaços com muito mato e flores. Flores vagabundas, daquelas que você vai encontrar como "flores do campo" na prateleira mais barata de uma floricultura. Bordô, amarelo queimado, marrom, laranja escuro, camurça, roxo desbotado, cáqui, bege, cinza. Ao longe, poucos pássaros, pássaros escuros; o movimento de algum cervo distante, uma lebre talvez. Uma coisa é certa, há muitas mariposas. Não borboletas. Mariposas. E, ao centro, você pode me encontrar deitada. Os olhos lá em cima no céu baunilha. Meus pensamentos em outra dimensão.

Veja, eu vivo nessa dicotomia. O verde musgo e cinza e a paleta de cores sujas harmoniosas. O verde musgo é minha tristeza. Minha profunda e desesperada dor que eu demorei tanto para aceitar, assumir e abraçar. As cores sujas, o melhor de mim, toda harmonia que meu ser consegue alcançar em momentos hedonistas, contemplativos, de conexão com o outro ou com o mundo.

Agora você já conhece um pouco do meu bosque. Minhas cores sujas. Não é exatamente uma paleta vibrante e ampla. Não são todos que gostam dessa combinação de cores. A maioria não vê beleza alguma em flores silvestres. Não é comum gostar de se embrenhar em um bosque pálido e opaco, ainda mais com a noite chegando. Isso pode até mesmo ser assustador. mas aprendi a amar esse lugar. A luz bate com certas músicas, ou quando estou caminhando sem rumo, quando danço, quando canto, quando tenho uma epifania, quando me conecto profundamente com outra pessoa, quando me dou conta da nossa pequenez diante do universo, dos universos; quando sinto minha essência tocando a essência das pessoas que eu amo, quando rio, quando escrevo, quando crio algo visual que consegue expressar minhas cores tão internas para o mundo exterior.

No entanto, o verde musgo e cinza são minha constante. Afinal, a luz bate de relance. É como algo suspirando incessantemente dentro de mim, arranhando de dentro pra fora do meu peito. Meus ouvidos projetam todos os outros sons mutáveis em um primeiro plano, e deixa esse som imutável em segundo. Como quando você está em meio a uma multidão e sua atenção seletiva tira o burburinho do seu consciente, fazendo você ouvir apenas a voz da pessoa que está ao seu lado. Mas o burburinho continua lá. E, às vezes, num deslize, você ousa prestar atenção nele. Quando isso acontece, quando eu percebo o musgo e cinza, eu caio em desesperança.

Eu estou deitada nesse mato escuro, cinza e úmido. Eu estou sozinha e ninguém jamais virá até ali. Nada do que eu faça vai colorir permanentemente esse lugar. Nenhum ser aqui jamais vai se conectar comigo tempo o suficiente, nem o cervo, nem a lebre. Eu poderia simplesmente deixar anoitecer. Escurecer de vez, e eu poderia permanecer ali, imóvel, sem sentir absolutamente nada, sem me comprometer com absolutamente nada, sem ter nenhuma responsabilidade com ninguém. Eu poderia chorar ali para sempre. Porque as cores sujas são a única coisa que me faz suportar, mas, às vezes, quando a luz bate, ela queima meus olhos e me obriga a ver. E eu não quero ver. Eu não preciso ver. E por não precisar ver, eu poderia simplesmente deixar escurecer. Escurecer de vez. Eu poderia permanecer ali imóvel, sem sentir absolutamente nada, sem me comprometer com absolutamente nada, sem ter responsabilidade alguma com ninguém. E eu poderia chorar atá adormecer ali pra sempre.

sábado, 7 de março de 2015

Jogo de Cartas

De um ano para cá, minha vida foi jogada em um triturador. Não, não interprete mal, caro e raro leitor. Isso não é ruim. Afinal, o que é a vida se não um caderno de rascunho passado e repassado a limpo por inúmeras vezes? 

Eu tinha um castelo de cartas; estava bem construído. Já tinha adquirido estabilidade e tamanho. Até que, um belo dia, eu olhei para ele e senti uma vontade imensa de demoli-lo. Sabe o que é? Sou uma pessoa extremamente perfeccionista; e o perfeccionismo tem disso, pode se tornar extremamente doentio quando os defeitos que você encontra não existem.

Assim, eu encarava meu castelo de cartas em cima da mesa. Meus cotovelos apoiados no tampo, dando sustentação às mãos que apoiavam meu rosto inexpressivo que o encarava. Os olhos vazios, mas cheios de lágrimas. Enchi os pulmões de ar, o segurei por alguns segundos, e comecei a soltá-lo pela boca em um sopro inicialmente tímido e depois violento. O castelo desandou.

Eu não sou de me gabar, mas, meus caros, era um belíssimo castelo! Tinha cômodos amplos. Várias salas, janelas que deixavam a luz do nascer e do pôr-do-sol entrar... E eu simplesmente o demoli. Por semanas martirizei-me pelo feito. Mas não por arrepender-me, e sim, por não fazê-lo. Exatamente! Eu tinha consciência da beleza e completude de minha construção e mesmo assim não me arrependia de tê-la destruído.

Pois bem. Levantei a cabeça e me recompus. Peguei um novo baralho e comecei um novo castelo. A falta de correntes de ar ajudava. A mesa agora parecia mais plana. E a prática me dera uma nova perspectiva de base. Tive ajuda. Algumas pessoas vieram junto a mim para me alcançar algumas cartas, avisar quando outras estavam mal posicionadas; há até aquelas que derrubam algumas cartas e acabam me ajudando a recolocá-las de forma mais firme.

Ainda não tenho um castelo. Ainda estou longe disso. Sei que quando ele estiver - e se ficar - pronto, a probabilidade de encontrar algum defeito inócuo e querer recomeça-lo do zero é enorme. Mas isso não me faz, nem por um segundo, achar que não vale o trabalho. Minha vida é assim. Eu sou assim... Prefiro construir mil castelo de cartas, sabendo que nenhum deles durará para sempre, do que passar a existência na estabilidade da Paciência ou na hipocrisia do Poker.



quarta-feira, 10 de julho de 2013

O Ar que Respiro

"Quando eu era criança, eu sabia o segredo para uma vida feliz. Siga as regras, dedique-se bastante aos estudos. E, se você se dedicar bastante aos estudos, então seu prêmio será... Mais estudos! E depois de mais estudos, você terá o que de melhor a vida tem a oferecer. Um trabalho, e dinheiro, e um futuro. Repleto de uma infindável e particular busca por MAIS!" (The Air I Breathe - 2007)

Essa citação sempre me fez pensar...

Fiz parte de uma geração criada com a lavagem cerebral de que toda a sua vida dependia quase que exclusivamente da faculdade. Assim, quando eu estava no colégio, eu tinha um plano: estudar muito para me dar bem nas provas e sempre ser aprovada com notas altas. Depois, estudar muito para ser aprovada no primeiro vestibular e fazer uma boa faculdade. Então, estudar muito para me dar bem nas provas da faculdade e me formar com excelentes notas. Enfim eu teria um bom emprego e passaria o resto da minha vida trabalhando nele.

"Eu invejo aqueles nunca questionaram isso. Eu? Eu precisava de uma saída!" (The Air I Breathe)

E, sabe, eu estava indo muito bem, até a parte de "terminar a faculdade". Eu havia me focado tanto no meu plano de vida que não tinha parado para analisar onde exatamente esse plano estava me levando. Meu olhar era reto a frente. E foi quando, num deslise, ousei espiar o que havia ao lado, que perdi a linha reta que havia traçado.

"Então de onde vem a mudança? E como a reconhecemos quando acontece?" (The Air I Breathe)

As pessoas costumam se definir por suas profissões, como se o meio de ganhar a vida fosse em si toda a vida. É comum também associar "talento" e "sucesso" única e exclusivamente com a profissão. E mais! Com a remuneração obtida através da profissão. Os grandes nomes que fizeram e fazem história são, em sua grande maioria, devido ao sucesso alcançado em sua área de atuação profissional.

Já parou para pensar que talvez haja um anônimo por trás desses grandes nomes da humanidade? Como o casal Frank e Lilian Gilbreth, em que de fato foi a esposa a grande pioneira em seus estudos e teorias, mas o crédito foi todo ao marido, afinal, uma mulher no final do século XIX não poderia se sobressair ao seu esposo, ainda mais fazer fama em seu lugar.

Mas quantos anônimos nunca foram e nunca serão elucidados? Quantas pessoas são um verdadeiro sucesso simplesmente em sua forma de viver a vida e quantos talentos não remunerados jamais serão aclamados?

E outros casos, daqueles que alcançaram a glória em suas carreiras mas a infelicidade total em suas vidas pessoais. Dou como exemplo, o escritor Edgar Allan Poe e o filósofo Arthur Schopenhauer. O primeiro, grande contista de terror e mistério, aclamado e endeusado por muitos. Um verdadeiro imortal da literatura gótica. Tinha sérios problemas com seus vícios em jogos de cartas, bebidas e ópio. Após a morte de sua esposa devido a tuberculose, se afundou ainda mais na embriaguez e no desespero, acabando por ser encontrado delirante na rua e morrendo mesmo depois de encaminhado ao hospital.

Schopenhauer, um verdadeiro pessimista, nunca se encaixou em nenhum sistema filosófico de sua época, sendo desconsiderado por muitos filósofos importantes de seu tempo. Entretanto, foi o pioneiro em muitos conceitos filosóficos que foram explorados posteriormente e que são estudados até hoje, fazendo dele uma lenda, um gênio. Em seu tempo, um pária. Viveu e morreu completamente sozinho e infeliz.

Não se pode ter tudo, afinal. Mas é você quem escolhe o que está disposto a sacrificar, o que realmente vale a pena em sua vida. O que conta.

Você por acaso já parou para pensar na sua vida sem a sua tão amada e/ou sonhada carreira? O que te sobraria? Quais seriam os seus talentos? O que faria de você uma pessoa especial?

Não estou dizendo que carreira não é importante. Todos nós precisamos ganhar a vida de alguma forma e podemos ser bem-sucedidos em qualquer emprego que tenhamos se nos esforçarmos. Mas falo de pessoas que abdicam suas vidas em nome de um emprego ou de uma oportunidade de carreira.

Às vezes, um foco demasiado rígido em um objetivo pode nos levar ao topo do sucesso profissional; mas parar para olhar para os lados, se embrenhar em caminhos desconhecido, descobrir novas possibilidades e novas opções é muito mais divertido e enriquecedor. Afinal, não é isso que é viver? Não é a felicidade o caminho e não o destino de chegada?

Minha vida seria total e completamente diferente se tivesse seguido o plano A. Existem milhões de possibilidades de como teria sido. Talvez melhor, talvez nem tanto... O fato é que gosto de onde estou. Não tenho ideia de quanto chegarei ao meu destino e qual ele é, mas a viagem tem sido memorável!

"Acho que finalmente percebi que, o que você faz com a sua vida é realmente só a metade da equação, a outra metade, a metade mais importante na verdade, é com que você está enquanto está vivendo" (Post Grad - 2009)


The Air I Breathe Trailer


quinta-feira, 20 de junho de 2013

"I'm back in the saddle again"

Parafraseando Aerosmith, "estou de volta ao comando de novo". A tradução redundante me pareceu bastante apropriada. 

Muitas vezes tentei retomar o falecido "The Good Quill", mas me faltaram as forças necessárias, além de hoje ver muitos daqueles textos lá deixados como puro "mambo jambo". Ele ainda está lá, fechado, somente para eu visitar tais águas passadas. Adoro registros assim, que nos permitem avaliar mais tarde o quanto as coisas mudam em tão pouco tempo que mal temos chance de respirar entre uma situação e outra.

Enfim, divagações a parte, aqui começo um novo blog com meus devaneios e divagações. Retomarei alguns dos textos do "The Good Quill" de que mais gosto e que ainda dizem muito sobre mim e o rumo que quero dar a minha escrita por aqui.

Para quem não tem a menor ideia de quem sou e/ou do que estou falando, me chamo Isadora Zemgeski, tenho 23 anos e sou uma entusiasta em tudo aquilo que eu puder ser. Assim, me meto a cantar, desenhar, dançar, pintar, bordar e escrever (ok, pode tirar a parte do "bordar"). É bem provável que eu não faça nenhuma dessas coisas realmente bem feitas, já que até agora não me aprofundei para valer em nenhuma. Mas faço bem o suficiente para me divertir, e afinal não é sobre isso que é a vida?